domingo, 7 de setembro de 2014

AS GRANDES GUERRAS DO SÉCULO XX




I – Neste ano de 2014 assistimos ao centésimo ano após o início da primeira guerra mundial (28 de Julho), ou “grande guerra”, como foi denominada até 1945. E fez sessenta e nove anos, no dia 01 de Setembro de 2014, o início da segunda guerra mundial. Usei estas datas como justificação interior para dedicar algum tempo ao aprofundamento de conhecimentos nesta matéria.

A segunda fase desta acção aferiu-se bem mais complicada: que livros ler? Esta dificuldade advém do seguinte facto: a quase totalidade dos livros de história que se encontram disponíveis nas lojas da denominada sociedade ocidental, narram as grandes guerras somente no palco do continente Europeu. Parecem, por exemplo, ser praticamente “esquecidos” pelos historiadores (e, consequentemente, praticamente desconhecidos pelos leitores): na grande guerra, o conflito no médio oriente, que envolve o Império Otomano, T. E. Lawrence (comummente conhecido como Lawrence da Arábia), o canal do Suez (uma das mais importantes construções na história da humanidade, e, de modo chocante, por esta praticamente desconhecida – o que, na minha honesta opinião, é claro exemplo do deficiente sistema educacional da humanidade: esta espécie animal possui uma capacidade única de transmissão de informação ao longo tempo [que, actualmente, é denominado de educação], e ainda não construiu um sistema digno desse poder), e o acordo Sykes-Picot, elemento fundamental para compreender a actual geopolítica do Médio Oriente; na segunda guerra mundial, os pormenores da guerra travada pelo Japão, e o conflito na Africa do Norte, praticamente desconhecidos pelo cidadão da sociedade ocidental.

Uma percepção objectiva da realidade não permite que me debruce, sem total análise científica, sobre as razões daquelas insuficiências. Mas, quaisquer que sejam essas razões, parecem, prima facie, encontrarem-se balizadas pelos seguintes vértices: pela aceitação da premissa de que a história é escrita pelos vitoriosos, e de que estes têm uma tendência para denegrir a parte derrotada e florear as suas próprias acções; pelo facto de o principal elemento a derrotar (a Alemanha) se encontrar no continente Europeu; pela exploração económica (seja pelos historiadores, seja pelas editoras) do sentimentalismo do “cidadão Europeu”, que o leva a manifestar maior interesse à destruição no seu continente do que a qualquer outra zona geográfica do mundo (a título de exemplo, um Português presta maior atenção a um pequeno massacre no território do seu País ou do País vizinho, do que um enorme massacre num distante território do Médio Oriente); pelas diferenças linguísticas, que chegam a impedir as próprias investigações dos historiadores; pela ignorância do cidadão comum, que, não conseguindo compreender o enquadramento sociocultural e político das várias sociedades mundiais, não alberga interesse nas informações relativas a essas sociedades (e, aqui, temos nova manifestação do elemento económico que direcciona os historiadores e as editoras); e pela era do excesso de informação em que vivemos – actualmente, o cidadão da sociedade ocidental é inundado por informações do seu País (grande parte, informações triviais), não possuindo tempo para a informação de carácter mundial.

II – Assim, decidido que estava, e continuo a estar, a fugir aos cânones ocidentais (pois, só assim é possível prosseguir por uma percepção objectiva da realidade), decidi seleccionar livros que me dessem a conhecer as duas guerras por perspectivas não ocidentais.

No âmbito da primeira guerra mundial, decidi ler a biografia de T. E. Lawrence, que permite um bom enquadramento do conflito na zona geográfica do Médio Oriente: Lawrence da Arábia, de Adrian Greaves, Edições 70, 2010. Trata-se de um livro praticamente impossível de encontrar em Portugal: só encontrei à venda numa loja, e só vi um exemplar. Paguei €22,21; um preço outrageous, na expressiva palavra inglesa, e uma das razões, penso, da dificuldade em os livros chegarem ao cidadão interessado. Livro magnífico, e que retrata uma personalidade igualmente fascinante, ao qual apresento apenas duas críticas: uma ao tradutor, pela (falta de) utilidade que atribui às vírgulas, importantíssimas para tornar um texto numa leitura fluente; uma ao autor, que confunde conceitos.

Repare-se, relativamente a esta crítica ao autor, a seguinte frase: A Síria era uma região especialmente complicada, dado que durante milhares de anos fora sujeita à passagem dos exércitos e a numerosas migrações. Na sua maioria, os vales da Síria agrupavam-se em função da nacionalidade dos colonos originais. Estes eram predominantemente árabes, argelinos, arménios, circassianos, curdos, gregos, persas e turcos, e tinham como único denominador a utilização da língua árabe. Quando deflagrou a primeira guerra mundial, toda a Síria e a região costeira a sul de Aqaba, até ao Iémen, já estavam ocupadas pelo Império Otomano há quatrocentos anos. Estas populações árabes encontravam-se completamente subjugadas pelos Turcos e, como súbditos obedientes aos seus senhores, careciam de toda e qualquer forma de união colectiva ou de identidade nacional (p. 31). Este parágrafo é um disparate total: primeiro o autor refere a existência da Síria, que, em boa verdade, só surge alguns anos depois; depois, o recurso ao elemento Síria representa o recurso a uma identidade nacional, para depois o autor dizer que aqueles povos careciam de união colectiva ou identidade nacional, o que é uma incoerência total; por fim, a meio do parágrafo, o autor refere-se ao elemento nacional daquelas povoações, mas este elemento não existia em muitas delas, principalmente, para o que ao caso interessa, nos denominados árabes, compostos por tribos, a grande maioria, nómadas.

Este recurso erróneo ao conceito de nacionalidade (e, já agora, também ao conceito de Estado) é visível em muitos livros de história, e ainda hoje não descortinei se tal se deve ao desconhecimento dos historiadores quanto à origem destes conceitos (o que tenho por inaceitável), ou se deve à sua intenção de tornar a exposição histórica narrativamente acessível ao leitor comum (o recurso às nomenclaturas da época para cada povoação ou zona geográfica poderia, realmente, tornar o livro num labirinto do qual o cidadão comum, como eu, não conseguiria sair, embora eu seja da opinião que esta dificuldade seria sempre ultrapassada com uma completa exposição de mapas no início do livro).

No âmbito da segunda guerra mundial, seleccionei o livro A Queda de Berlim, de Antony Beevor (Bertrand Editora, 2011). Apesar de se referir à Alemanha, e ao Continente Europeu, o livro proporciona uma perspectiva única da viagem do exército da URSS até Berlim. Porquê? Porque foi este exército a conquistar a capital Alemã. Os principais intervenientes foram o exército da primeira frente Ucraniana (comandada por Konev), o exército da 1ª frente Bielorrussa (comandada por Zukov), e o exército da 2ª frente Bielorrussa (comandada por Rokossovsky). De futuro, tenciono seleccionar referentes ao papel do Japão na guerra e à guerra no continente Africano.

Dois livros cuja leitura recomendo vivamente.

No topo do texto a fotografia de uma trincheira, elemento comum das duas guerras.

Bruno Miguel dos Santos Carrilho Tabaio
07 de Setembro de 2014

terça-feira, 2 de setembro de 2014

O ELEMENTO HISTÓRICO




         I – A procura por uma percepção objectiva da realidade tem como mastro principal um vasto estudo da história da humanidade. É pela via da sua análise que adquirimos conhecimento da origem das nossas crenças, e da realidade social antes da sua existência. É por via da história que tomamos a percepção de que as nossas crenças foram criadas no âmago do mundo social, muitas vezes ao acaso, outras vezes com uma certa finalidade. E é esta percepção de “criação” que nos permite ir interiorizando a ideia de que certa crença que nos foi transmitida pela envolvente social (família, escola ou esfera pública em geral), e que sempre tomámos como transcendente e dogma, não é, na verdade, elemento da realidade.

         Em suma, pretendo transmitir a ideia de que é a história que nos permite alcançar a nossa independência, a nossa autonomia intelectual. Sem ela somos mero fruto da sociedade, e somo-lo inconscientemente. Com ela somos fruto da natureza, e integramo-nos, por vontade, na sociedade.
No âmbito deste intróito relativo à importância da história, irei apresentar neste blog alguns livros que me fizeram companhia. Infelizmente, as regras da sociedade impõem um conjunto de obrigações sociais susceptíveis de ocupar quase dois terços do dia, pelo que a leitura é vagarosa.

         II – Começo pelo livro Salazar, de Filipe Ribeiro de Menezes. Seguramente a segunda melhor leitura a que já procedi, só não ultrapassando César, de Adrian Goldsworthy.

         Não obstante a obra de qualidade magnífica, uma crítica ao texto é a de, por vezes, faltar algum enquadramento histórico directamente (mas não indirectamente) alheio à personalidade objecto do texto, como por exemplo a exposição dos factos da vitória final de Franco (passa-se directamente da guerra civil em acção para Franco no poder) ou das razões e acções para efectivar o bloqueio continental da Coroa Britânica. Em boa verdade, é compreensível a razão de o autor não proceder a essas exposições: está em causa uma biografia, e não a exposição histórica de um certo período da história da humanidade. Mas se isto é verdade, e é, há igualmente a considerar que está em causa uma biografia política (como se afere pelo facto de terem sido dedicadas as primeiras 50 páginas à vida pessoal de Salazar, e as restantes 600 à sua carreira política). Pelo seu carácter político, as biografias neste género devem, no meu entender, proceder a um vasto enquadramento da política da época do biografado. Outro argumento contra esta minha opinião poderá ser a de que tal exposição tornaria o livro demasiadamente extenso, e, consequentemente, com maior custo financeiro; o que é verdade. Mas pode-se perguntar: deverá o rigor ceder lugar?

Um segundo aspecto que gostaria de salientar é referente às letras vermelhas onde se lê Salazar. O vermelho encontra-se socialmente conotado com sangue, guerra, autoritarismo, totalitarismo e repressão, seja política ou social. Assim, é tentador abrir a possibilidade de se estar perante a exploração, com fins económicos (possibilitar maiores vendas), da ideia social de Salazar como autoritário, ditador e repressor. Com Salazar a vermelho, o livro aparenta, conscientemente, apadrinhar a imagem socialmente negativa de Salazar que actualmente vigora. Por outro lado, também é possível considerar que a escolha da cor vermelha pode dever-se, muito simplesmente, a razões estéticas: é já antiga a aceitação da sua harmonia com a cor preta. Eis então uma questão à qual não me atrevo a tomar posição. Quem sabe a razão da escolha?

Em terceiro lugar, concedo-me a possibilidade de proceder a mais uma divagação. Este livro custa actualmente cerca de € 30 nas livrarias. O elevado preço dos livros em Portugal deve-se, já se sabe, ao autoritarismo comercial das editoras. Embora eu tenha o volume único, gosto de pensar que o facto de Salazar andar a ser distribuído, em sete volumes, por via do jornal Expresso, se deve ao bom senso e boa postura social do autor em dar a conhecer ao mundo, e por muito baixo preço, o seu trabalho e a história do homem que nos governou e que influenciou o mundo. Trata-se de um devaneio meu que pode nem corresponder à verdade, traduzindo sim uma percepção subjectiva da realidade, que eu tanto condeno nos outros, mas à qual não consegui resistir.

Por fim, um comentário relativamente a Salazar. Não obstante eu não concordar com a sua política interna ou com a sua ideologia, sou admirador profundo da sua política externa. Influenciou o final da guerra civil Espanhola (para bem de Portugal), foi um dos pilares para que a Espanha não tivesse entrado em guerra, vendeu volfrâmio a ambas as partes na guerra (e ambas as partes tinham conhecimento), acordou ceder os Açores aos aliados (com o conhecimento da Alemanha), comprava armas igualmente a ambas as partes (e ambas tinham igualmente conhecimento), e livrou Portugal da guerra. Tudo com uma mestria que parece ter sido forjada na casa dos deuses. O livro permite-nos admirar a política externa de Salazar e a sua consideração como um dos maiores génios políticos na história da humanidade.

Recomendo vivamente a leitura de Salazar, uma obra-prima.

Bruno Miguel dos Santos Carrilho Tabaio
02 de Setembro de 2014

domingo, 24 de agosto de 2014

CERTIDÃO DE NASCIMENTO




Este texto é o primeiro de uma segunda vida do presente blog. Um texto em tal posição deve sempre assumir o cargo de dar a conhecer a razão da sua existência, portanto, de proceder à exposição do objectivo que com o blog se pretende atingir. Sucede que tal exposição é tanto mais difícil quanto não se tenha um objectivo perfeitamente delineado, como acontece in casu. De onde que resta somente a via da descrição do âmbito que levou à sua criação.

Um dos desígnios do meu intelecto é a tentativa de alcance de uma percepção total e objectiva da realidade. Trata-se de uma viagem por caminhos atribulados e incertos, onde, as mais das vezes, as nossas próprias crenças surgem como verdadeiros muros de Berlim separando duas realidades: a percepcionada por nós e a verdadeiramente existente. Por vezes o muro é tão alto (as crenças estão de tal modo enraizadas em nós) que passo mais tempo a superar cada muro do que a chegar ao seguinte. Nesta minha viagem tenho particular gosto em ir redigindo as várias conclusões que vou atingindo. Mas essa redacção tem igualmente uma razão prática: a tentativa de percepção da realidade abrange uma tal vastidão em matérias que esse caminho tem de ser percorrido por uma técnica de unpuzzle, que, por sua vez, necessita de ser acompanhada pela escrita, sob pena de se perder o fio à meada. O objectivo último será o de, analisadas todas as peças (se tal for alcançável), se proceder à reconstrução do puzzle a fim de se obter uma análise abrangente de toda a realidade.

É neste âmbito que se encontra o presente blog. Ele não é mais do que a publicação de alguns textos cujas folhas se foram acumulando em casa. Tendo-os aí amontoados, porque não os dar a conhecer? Desvantagens não parecem existir, e pode até se suceder ter alguém o interesse em se sentar neste transporte e acompanhar-me na viagem.

Por fim uma nota quanto à imagem de fundo do presente blog. Uma biblioteca enquanto manifestação máxima do conhecimento e intelecto do ser humano, quer pela paz e tranquilidade que proporciona, indispensáveis ao pensamento, quer pelos livros que alberga e que constituem exteriorização tradicional da capacidade do ser humano em transmitir informação. No meio da sala um sofá para conferir algum conforto ao meio de transporte do cérebro.

Bruno Miguel dos Santos Carrilho Tabaio
24 de Agosto de 2014